sexta-feira, 15 de outubro de 2010

Cérebro Eletrônico - Deus E O Diabo No Liquidificador


O desafio de resenhar um lançamento que é claramente um documento representativo de uma cena musical colaborativa e progressista: não ser condescendente. O terceiro álbum do Cérebro Eletrônico, liderados por Tatá Aeroplano, traz participações de figurinhas carimbadas como Dudu Tsuda e Tulipa Ruiz, além do neo paulistano via Cuiabá Hélio Flanders (Vanguart). Credenciais da turma do baixo Augusta, da música independente criativa e não apadrinhada. Pareço Moderno, o disco anterior do quinteto, já soava bastante coeso e singular, um rock de asfalto, com um pé na psicodelia e outro no pop, com letras espertas. Quando uma banda atinge certo grau de segurança, o próximo passo sempre é precedido de dúvidas. Apostar em novos ritmos? Seguir a fórmula?. Mas é claro que essas questões surgem com mais frequência em quem escreve sobre música, e não em quem escreve músicas. Tatá provavelmente deixou rolar, e entregou esse Deus E O Diabo..., que eleva a viagem musical da banda alguns degraus acima. Não há revoluções estilísticas aqui. Apenas uma condição de fluidez, de idéias e de melodias, pertinentes áqueles que não pensam demais. Os rocks estão mais potentes, as baladas mais contundentes, o que era flerte virou mergulho psicodélico e os acenos a música brasileira são mais claramente avistados. Tatá continua mandando versos simples que, repentinamente, assumem condição memorável, pela ironia ou derramado romantismo. A primeira metade do álbum é feita de canções vencedoras: o rock certeiro de Decência, a balada e primeiro single Cama, de refrão imediato; o contorcionismo de O Fabuloso Destino Do Chapeleiro Louco; a construção engenhosa de Os Dados Estão Lançados; o sessentismo de Garota Estereótipo - com a participação de Hélio Flanders sendo fundamental á atmosfera noir. Duas canções parecem fazer a transição para aventuras mais longas: 220V, funkeada, e a melancólica e bonita Sóbrio e Só. Daí pro fim, a banda ataca uma espécie de experimento de junção com temas mais tropicais, carnavalescos, intrincados. Desquite joga com as palavras, quase nordestina no ritmo. Realejo Em Dó se aproxima do progressivo/viajante. A canção título finaliza a tour com uma quietude bela e reflexiva. Enquanto esses caras continuarem a se aventurar, colaborar e criar obras como essa, os elogios não serão frutos de um hype sem sentido e provinciano. Serão mera constatação. 8/10
No site da banda, é possível baixar o single Cama e comprar o álbum.

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