sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Thiago Pethit - Estrela Decadente


Dois momentos importantes que antecederam o lançamento de Estrela Decadente, segundo disco do compositor e cantor Thiago Pethit, ajudam a explicar o molde e o resultado obtidos com o recente trabalho: Thiago realizou uma apresentação interpetando Lou Reed para um projeto do Sesc São Paulo em janeiro de 2011: o desafio não era pequeno: com uma obra não apenas "intocável", Reed é dono de repertório amplo e diverso, além de possuir aspereza que, a princípio, não poderia se sustentar tão facilmente. Ok, era apenas uma apresentação. Mas a maneira como Pethit escolheu o repertório e demonstrou postura forte parecia indicar que o artista passava por uma condição de exploração de seus limites como frontman, algo que se refletiria também em suas composições. O segundo momento foi outro show, no início deste ano, em que músicas de Estrela Decadente estavam sendo ajustadas e testadas. Mais uma vez, a comparação com o cantor das primeiras apresentações de Berlim,Texas (seu primeiro disco) se tornava inevitável: muito mais confiante no palco, apresentando composições instrumentalmente mais incisivas e de imposição vocal mais à feição de sua origem teatral. Como essa evolução iria chegar ao disco pronto?

A boa notícia é que Estrela Decadente captura a energia dos shows recentes e confirma as composições mais expansivas. Entre as influências que já se mostravam no trabalho anterior - mas aqui amplificadas - estão o glam rock, o folk, o pop e o vaudevilesco. A primeira amostra desse Pethit de consciência pop bem firme aparece logo na introdução com Pas de Deux: em uma levada ao piano e backing singers evocando o cabaré, há um interlúdio disco, alusão aos versos que brincam com a aproximação entre duas pessoas. A sequência com Moon, um espécie de faixa perdida no tempo do pop, entre a escuridão oitentista e a decadência setentista, evoca uma trinca de Bowie, Reed e Iggy Pop. Tal alusão não fere a qualidade e a sensação de frescor que a música traz. Dandy Darling é um monstrinho glam, de refrão obviamente explosivo: "Amigo/escute o que eu digo/só venha comigo/se quer se perder por aí." 

A porção mais intimista do compositor se apresenta com Perto do Fim, um dueto com Mallu Magalhães. De tom melancólico e levada simples e melódica, serve como uma desacelerada após três músicas mais "espinhosas", e remete muito mais ao primeiro álbum. So Long, New Love, conhecida por ter sido trilha de uma campanha publicitária, surge como uma canção muito mais desenvolvida, de tempo desacelerado, apagando a impressão de indie-pop mais ordinário da versão anterior. Estrela Decadente dá nome ao disco e segue como um rock vigoroso com pé na sarjeta; aqui já concluímos que Pethit não se acomodou com os elogios recebidos em sua estreia e decidiu seguir seus instintos criativos. É claramente alguém mais despido e confiante, com todas as implicações de uma opção como essa. A leveza de Haunted Love, quase uma canção de ninar repleta de ooooohs - aaaaaahs dos vocais de apoio carrega uma aura verdadeiramente lúdica.

Mas o compositor que se aventurou por todo o álbum por emoções mais cruas, situações mais explícitas e músicas mais complexas retoma e encerra o processo com Devil in Me e Surabaya Johnny: a primeira, de título bastante significativo, poderia apenas reproduzir um clichê, mas soa realmente como uma autoanálise do autor diante de demônios internos - vide "Eu vendi minha alma pra saber que o diabo sou eu", cantada ao fim da música. Cida Moreira, muito admirada por Pethit participa da vaudevilesca Surabaya Johnny (versão do original de Bertolt Brecht e Kurt Weill), o momento mais abertamente teatral do trabalho. 

Estrela Decadente pode surpreender quem não pôde observar os momentos citados no primeiro parágrafo, mas não deixa dúvida para quem ouve: é uma evolução das ideias de Berlim, Texas e também uma expansão da entrega verificada ali. Entre uma atmosfera que evoca momentos de criação em meio a crises de decadência geracional, Pethit talvez tenha retratado, de forma indireta, as mazelas de São Paulo em 2012, um ambiente repressivo em que seus moradores tentam se desgarrar através de atividades artísticas como a música. Um disco de boas canções que nos leva a relacionar suas referências, o momento atual de seu criador e de suas inspirações é um salto relevante. 8/10   

Baixe o disco : http://www.thiagopethit.com/     

             

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