terça-feira, 7 de maio de 2013

Clarice Falcão - Monomania: Entrevista e resenha




O nome "Clarice Falcão" é geralmente precedido por uma série de introduções: acumulando rótulos de multiartista, atriz-cantora-roteirista, comediante-compositora, fenômeno da internet e quetais, a carioca nascida em Pernambuco lança seu primeiro álbum, Monomania, e encara o teste de quem acumulou fãs via YouTube: a mesma receptividade entusiasmada vem acompanhada da já conhecida caixinha de ódio dos comentários e replies. O importante é saber se o disco se sustenta sozinho e acima das nomenclaturas destinadas à sua autora.

O EP introdutório lançado em 2012 trazia canções simples, mas carregadas de uma construção imagética de romantismo e humor, levadas por instrumentação simples e acertada. A boa notícia é que as quatro canções do EP estão presentes em Monomania em versões amplificadas, mas mantendo a base de suas qualidades. As novas composições parecem mostrar uma evolução da confiança de Clarice e do acerto de produção: as narrativas permanecem como grande trunfo, trazendo ao ouvinte uma proximidade com as experiências citadas; o instrumental deixa espaço para a voz de Clarice, mas os arranjos dão dimensão maior às músicas, em uma execução limítrofe do minimalismo na inserção dos instrumentos.    

A dinâmica do álbum é exemplificada em momentos como Um Só, canção que condensa em pouco mais de um minuto e meio uma declaração intimista dentro de uma melodia delicada e lenta. Parte do brilhantismo das letras de Clarice surge como que por espontaneidade: " A cor do seu rosto eu já sei de cor." A sequência com Fred Astaire, mais recheada, com pianos e percussão marcada e uma pegada mais veloz demonstra que, embora monotemático, o disco não se arrasta em repetições e ganchos formulaicos.

Em Qualquer Negócio a cantora se posiciona como um acessório qualquer apenas para estar próxima do amado; a letra se equilibra entre citações bem humoradas, mas o corpo verdadeiro é um apelo singelo e verdadeiro por empatia; e o espírito do trabalho vai tomando forma, canção a canção: Clarice escreve sobre amor, e sua habilidade em jogar com as palavras trazendo momentos de estranhamento e beleza é o equivalente a atravessar períodos escuros com rápidas aparições solares em questão de minutos. O dueto com SILVA é um ponto alto do disco, reunindo dois jovens compositores que dividem a mesma relação de admiração à melodia e estrutura. Eu Me Lembro brinca com um escopo melódico que vai do esquelético ao exuberante enquanto a dupla troca ideias desencontradas sobre um... encontro.     

Monomania é sobre amor. São músicas inapelavelmente melódicas, de arranjos delicados e letras espertas. Caminha na estrada do indie-folk de She And Him, Soko, Feist. Mas a garota que cresceu ouvindo Chico Buarque e Luiz Tatit também admira um cuidado especial na narrativa. E o disco não é apenas um exercício artístico pouco interessado: Clarice Falcão revela aqui seu amor à composição e à música, na maneira em que constrói seu trabalho em variadas formas líricas - embora de estética coerente - explorando um único tema. Mas é um tema que pode se desdobrar em inúmeros fatos e pequenos detalhes da vida, e essa multiplicidade é tratada com habilidade por Clarice. Desprezando o cinismo, Monomania é resultado de um coração grande o suficiente pra abrigar muitos sentimentos. Os detratores irão dizer que não passa de mais uma cantora fofa. Fofurice não falta, realmente. Mas raramente foi tão relevante. 8/10                  
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* O que podemos esperar do seu primeiro álbum, além do que você já adiantou na sua página do Facebook?

Acho que é um álbum do ponto de vista do apaixonado. As músicas todas têm um eu lírico bem parecido e foi muito divertido usar os arranjos pra dar universos diferentes pra cada uma. Por outro lado, eu gosto muito de escrever letra, e minhas músicas são muito narrativas - uma preocupação minha era não engolir as histórias das músicas com arranjos gigantescos. Fui muito feliz na minha parceria com a Olívia Byington, que produziu o disco comigo e trouxe junto com o Ricco Viana uma musicalidade que não fazia tanto parte do meu universo.

* Compor, gravar e lançar um disco hoje em dia requer um retorno financeiro muitas vezes adquirido apenas por turnês. Haverá uma turnê e como equilibrar suas outras atividades com essa tarefa?

Quero muito fazer uma turnê. Acabei de fazer os primeiros shows da minha vida e descobri que é uma das melhores sensações do mundo. Entendi bem melhor gente que pula de paraquedas. Já tenho um show marcado em São Paulo, shows em Belo Horizonte, Curitiba e Recife encaminhados e estou doida pra marcar mais. 

* Sei que é fã do Magnectic Fields. O Stephin Merritt uma vez disse algo curioso sobre o "69 love songs" (mais notório disco da banda estadunidense): " Não é um disco sobre o amor, mas sobre canções de amor, o que não tem nada a ver com amor." Na mente dele, as canções de amor são tão importantes pro pop que mereciam um trabalho como aquele. Ao mesmo tempo, ele se distanciava da experiência puramente pessoal e ao invés disso criava personagens e situações. "Monomania" é um disco de "love songs" ou "sobre 'love songs'"?

As músicas do disco definitivamente são canções de amor. Não são músicas irônicas, não é um comentário, é um CD ingênuo mesmo. Acho que a graça está nessa ingenuidade. Como eu disse, o CD é todo do ponto de vista do apaixonado, e gente apaixonada é muito idiota. Eu, pelo menos, sou.

* Na gringa é muito comum artistas que se envolvem em diversas áreas; de recente dá pra citar a Zooey Deschanel , Scarlett Johansson e a francesa Soko, que atuam e cantam. Aqui no Brasil, nem tanto. Você teme uma cobrança do tipo; "Curto a Clarice atuando mas cantando não."?

Estou cada vez melhor em abstrair as críticas e as cobranças. Descobri que isso é muito importante se você quer ter uma carreira artística - especialmente na internet. É só ler os comentários de qualquer vídeo do Porta dos Fundos, em cima de todo comentário que diz "Pior vídeo" tem um que diz "Melhor vídeo". É impossível agradar a todo mundo. E, por mais difícil que seja, eu tenho tentado dar mais atenção aos que dizem "Melhor vídeo".

* Fale sobre "Eu Não Faço a Menor Ideia do Que eu tô Fazendo Com a Minha Vida", segundo longa do Matheus Souza em que você vive a protagonista.

O Matheus me chamou pra protagonizar o filme a mais ou menos vinte dias das filmagens, as filmagens em si duraram pouco mais que quinze dias, e o filme não tinha dinheiro algum - ou seja, um projeto bem a cara do Matheus. O Apenas o Fim (primeiro longa dele) foi feito em um esquema bem parecido. Eu me diverti muito. O roteiro era muito legal, o Matheus é talentosíssimo e como a equipe era composta basicamente por estudantes de cinema, todo mundo trabalhava com muito gosto. 

* O Porta dos Fundos e O Fantástico Mundo de Gregório, assim como suas músicas, se espalham e fazem sucesso pela internet. Crê que sua geração já trabalhe com as ferramentas digitais do-it-yourself de maneira natural,demonstrando assim uma certa desconexão de um formalismo de profissão?,Digo, é possível que em 2015 Clarice Falcão lance um álbum de hardcore e seja protagonista da novela e escreva um livro, tudo junto?

Faço parte de uma geração em que os rótulos profissionais (atriz, cantora, compositora...) importam muito pouco. E eu acho isso muito bom. Isso abre infinitas possibilidades. Cada veículo é ideal para dizer um certo tipo de coisa. Gosto muito de artistas plurais e quero continuar sendo plural pra sempre. 


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