terça-feira, 14 de janeiro de 2014

"Ela" é alegoria da vida pós-digital



"Ela", novo filme escrito e dirigido pelo diretor estadunidense Spike Jonze, traz o retrato de uma vida pós-digital, repleta de tecnologia que (poderia) facilitar a conexão entre humanos e entre humanos e máquinas. A trama se passa em um futuro indefinido, mas espelha a vida que de alguma forma já presenciamos. 

O personagem central, vivido por Joaquin Phoenix, trabalha escrevendo cartas personalizadas, trazendo emoções e sensibilidade para pessoas se comunicarem. Entretanto, Theodore não possui a mesma habilidade quando tem de organizar seus próprios sentimentos: vindo de um casamento fracassado, passa noites solitárias jogando videogame ou apelando para o sexo virtual. Seu refúgio mais próximo da interação humana é com sua amiga Amy (Amy Adams).

A vida de Theodore é chacoalhada com a aquisição de um sistema operacional avançado, que assume o nome de Samantha (Scarlett Johansson). Ultra-avançado, o sistema não apenas é capaz de perceber emoções mas também consegue criar suas próprias, se tornando uma excelente companhia para Theodore.

Aqui temos alguns temas que o filme levanta: o protagonista lida bem com emoções de outras pessoas por ser sensível, mas é confuso em relação as suas próprias; é capaz de se relacionar - a princípio - com desenvoltura com um agente artificial, mas falha em ser boa companhia para as mulheres. Inadequação social e a aparente proximidade conquistada através do mundo virtual; a conexão frágil entre as pessoas; o mundo da consciência computacional; todos esses tópicos estão no filme.

Belamente interpretado por Joaquin Phoenix, Theodore encontra acolhimento na interação com uma consciência divertida, inteligente e cheia de vida que não possui corpo. Esse paradoxo inicial trará consequências para a relação entre o humano e o sistema operacional. Assim como na sequência de atos dentro de uma relação entre humanos, a troca de experiências entre o real e o virtual traz ruídos que balançam o equilíbrio da relação. O porém aqui é que uma das pontas é capaz de processar esse ruídos de forma diferente, criando algoritmos de emoções e seguindo um caminho de expansão além do humano.

"Ela" encanta por trazer uma estória original e por contar essa estória de forma divertida. A solidão afeta a todos, e os sentimentos que nos levam a buscar contato com outros são universais e comuns, trazendo a empatia com Theodore. O mundo parece não digerir a simbiose humano-virtual, já que as centenas de amigos ou seguidores em redes sociais não trazem uma fruição completa do espectro relacional. O filme contempla esse choque ao introduzir uma personagem que não se vê, não possui corpo mas se comunica livremente.

Sensível e divertido, "Ela" é uma alegoria da maluca vida pós-digital. E da busca por amor que nos faz, ainda, humanos.

Claro que se tratando de Spike Jonze, a música é elemento fundamental: elaborada pelo Arcade Fire e Owen Pallet, traz músicas de Karen O, Breeders, N.A.S.A. e do próprio grupo canadense. "Ela" tem previsão de estreia para o dia 17 de janeiro no Brasil.     
      

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